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O fator Milei nas eleições argentinas de outubro

setembro 29, 2025 | by Igor

Milei 2023 (Reuters)

29 de setembro, segunda-feira. Na Argentina, o governo do libertário Javier Milei está perto de cumprir metade do mandato de quatro anos garantido após a vitória nas Eleições Gerais de 2023. Defensor de bandeiras como o enxugamento da máquina estatal, o presidente oferta uma estabilidade inédita nos anos recentes do país, ainda que para isso tenha realizado uma campanha de desmonte das políticas públicas voltadas aos grupos vulneráveis da sociedade, além de acordos com o FMI (Fundo Monetário Internacional) que trazem à tona o fantasma do endividamento. No meio de tudo isso, os argentinos voltam as urnas, próximo mês, para renovar parte do legislativo federal, em uma prova de fogo para o futuro de Milei.

OUTSIDER EM 2023

Figura desconhecida pelo eleitorado argentino, Javier Milei alavancou o pequeno partido LLA (La Libertad Avanza, libertário) aos holofotes da mídia, em especial após liderar a contagem de votos no PASO — sistema de primárias que antecedem a data da eleição em que são definidos os candidatos de cada aliança ou partido político — em uma reviravolta que mostrava o nível de ceticismo da população com os partidos tradicionais, tanto de esquerda (bloco Peronista) como de centro à centro-direita (UCR E PRO).

Os resultados, de acordo com o CNE (órgão eleitoral do país), mostravam uma liderança mínima do LLA com 29,86% do total de votos válidos, logo atrás ficando a aliança Juntos por el Cambio, com a candidata Patricia Bullrich, ex-integrante ministerial do governo de Mauricio Macri (2015-2019), com 28,00% e , na terceira colocação, Sérgio Massa com a fórmula eleitoral sustentada pela UP (Unión por la Patria, peronista), representando o governo do então presidente Alberto Fernández, com 27,28%.

Na primeira volta das eleicões gerais em outubro, a UP conseguiu abrir vantagem em meio a divisão do campo conservador, ficando em 1 lugar. O LLA desbanca a candidatura de Bullrich, mas como forma de obter uma transferência de votos mais segura, Milei oferece um espaço na formação de um possível novo governo. Desde o início dos comícios pós-primeira volta, as pesquisas de opinião já indicavam uma liderança folgada do libertário contra Sérgio Massa, ex-ministro de Economia do governo incumbente, em um cenário em que a Argentina passava por uma forte aceleração inflacionária e desvalorização da moeda nacional. Na segunda volta, Milei obteve 14.554.560 de votos (55,65% dos válidos), com apoio evidente do eleitorado alinhado a candidata Bullrich.

Candidato distante dos blocos tradicionais da política argentina, Milei se saiu vitorioso nas eleições de 2023 — Foto: Agustin Marcarian/Reuters.

POLÍTICAS ECONÔMICAS

Para conter os índices de descontrole econômico, Javier Milei adotou uma política de desvalorização do peso argentino, moeda oficial, com intuito de criar um ambiente fiscal seguro ao investimento estrangeiro, expressivamente de capital privado, e o aumento da exportação de produtos. Além disso, reduziu significativamente os subsídios estatais voltados a execução de políticas públicas nas mais diversas áreas, como a paralisação de obras de infraestrutura e o repasse de verba para as províncias.

Os efeitos foram logo sentidos pela sociedade, com destaque para as camadas mais vulneráveis economicamente. No 1° semestre de 2024, segundo o INDEC (Instituto Nacional de Estatísticas e Censos), 52,9% dos argentinos, algo em torno de 15,6 milhões, viviam abaixo da linha da pobreza — valor internacional que identifica pessoas e famílias com uma renda mensal de menos de 209 dólares por mês — em uma realidade marcada pela subida dos preços dentro do mercado consumidor, sendo este “estrangulado” pelas medidas de austeridade de Milei.

Hoje o resultado é mais favorável ao presidente: 31,6% dos argentinos estavam na esfera da pobreza, no valor referente ao 1° semestre de 2025. Mas a falta de poder de compra por parte da população ainda é se faz presente como um problema crônico na história recente da Argentina.

ELEIÇÕES LEGISLATIVAS DE 2025

Até meados desse ano, os analistas políticos asseguravam que a gestão de Javier Milei apostaria na série de medidas econômicas implementadas, nos últimos quase dois anos, como trunfo político para reduzir a desvantagem nas casas legislativas, onde Milei enfrenta resistência para aprovar seus projetos de interesse.

A atual constituição parlamentar da Câmara dos Deputados dá a oposição privilégio ao barrar as ações de Milei, embora esse grupo já tenha se mostrado em diversos momentos fragmentado ou, melhor, sem coordenação clara no papel de atuação política contrária ao governo. Já no Senado, presidido por Victoria Villarruel, vice-presidente do país, com que Milei está rompido após desavenças, o cenário é ainda mais desfavorável: apenas 20 senadores se encontram no arco de aliança do governo dentre o total de 72.

No entanto, as eleições da província de Buenos Aires, em 7 de setembro, acenderam um alerta sobre a popularidade decrescente do governo federal. Reduto peronista, a província que reúne pouco mais da metade da população do país deu um resultado desastroso para Milei. Ao fim da apuração das urnas, o Fuerza Patria (esquerda) conquistou 47,35% dos votos e a maioria das cadeiras disputadas, enquanto o LLA, em parceria com o PRO, conquistou 33,78% (parcela menor do que a conquistada dois anos atrás de 51%, somando-se os votos dos dois partidos).

Na média das pesquisas divulgadas em setembro, no âmbito nacional, a UP empata na margem de erro com a LLA, ambos com cerca de 41% dos votos válidos. Bem distante estão partidos e alianças menores, como o FIT-U (extrema-esquerda) e facções do PRO, separadas dos acordos com os governistas libertários em províncias estratégicas, e o centrista UCR, sendo estes detentores de um percentual abaixo dos dois dígitos (sintoma da polarização partidária entre os campos políticos de Milei e dos peronistas). Portanto, essas eleições de meio de mandado devem ser um referendo popular acerca da administração de Javier Milei e seu governo, com possíveis impactos no cenário político da Argentina com reflexos em sua economia fragilizada.